sábado, 30 de janeiro de 2010

3. OS CASOS: O NOMINATIVO E O ACUSATIVO

Vamos agora estudar os casos latinos. Como o assunto é longo, abordaremos inicialmente apenas a função principal de cada caso, deixando o resto para futuros aprofundamentos.


O
NOMINATIVO – SUJEITO DA ORAÇÃO

O nominativo é essencialmente o caso do sujeito.

Tomemos alguns exemplos bem simples:

1. A MENINA CANTA.
Nessa oração simples, fica bem fácil de identificar o sujeito A MENINA e o predicado CANTA.

A palavra menina em latim é puella, e pode apresentar seguintes flexões: puella, puellae, puellarum, puellis, puellam, puellas. No exemplo acima, “menina” é o sujeito da oração; portanto, entre todas as formas possíveis para essa palavra, escolheremos a do nominativo singular – puella.

Nossa frase fica então:
PUELLA CANTAT.

2. Outro exemplo:
O MESTRE EDUCA.
Nesta oração simples identificamos o sujeito O MESTRE e o predicado EDUCA. A palavra mestre em latim pode ter as seguintes formas: magister, magistri, magistrorum, magistro, magistrum, magistros, magistris. Como sujeito, a palavra mestre deve ir para o nominativo singular: magister.

Nossa frase ficará então:
MAGISTER EDUCAT.

Antes de continuar dando mais exemplos de emprego do NOMINATIVO, proponho estudarmos o ACUSATIVO. Creio que o emprego das flexões de caso começará a ficar mais claro se dispusermos de dois casos em uma mesma oração.


O CASO ACUSATIVO – O OBJETO DIRETO

O acusativo é, por excelência, o caso do complemento verbal denominado em português OBJETO DIRETO.

Para bem entendermos o que significa um complemento verbal é indispensável sabermos que há verbos de sentido completo e verbos de sentido incompleto. Usando uma outra terminologia, podemos dizer que há verbos de predicação completa e verbos de predicação incompleta.

Os verbos de predicação completa tendo sentido completo, não exigem nenhum tipo de complemento. Exemplos: O pássaro voa, o ladrão fugiu, Pedro morreu, A mestra educa. A ação expressa pelo verbo, ou seja, o predicado, concentra-se toda no verbo, sem necessidade de nenhum complemento. A oração se constitui de apenas dois termos, o sujeito e o verbo. Esses verbos de predicação completa também são chamados de intransitivos.

Já os verbos de predicação incompleta são verbos que, tendo sentido incompleto exigem um complemento, um termo que lhes complete o sentido. Imagine que eu diga, por exemplo “ele perdeu”; a oração tem sentido incompleto pois não declarei “o que ele perdeu”; é preciso, para que a oração tenha sentido completo, que eu declare “o que” ele perdeu: Ele perdeu a carteira; ele perdeu os óculos; ele perdeu a compostura...

Outro exemplo: se eu disser “Maria ganhou”, imediatamente se fará a pergunta, “que foi que Maria ganhou? Maria ganhou um prêmio, Maria ganhou um doce, Maria ganhou o jogo. A oração passa a ter obrigatoriamente três elementos: o sujeito, o verbo e o complemento do verbo.
Vamos a alguns exemplos:

1.) As servas amam as senhoras.
Nessa oração temos: o sujeito “as servas”, pois é delas que se afirma o predicado “amam as senhoras”. Depois temos o núcleo do predicado, o verbo “amar”; o verbo amar, sendo de predicação incompleta (o que ou que,as servas amam?) exige o complemento, o objeto direto “as senhoras”.
Resumindo:
a) servas-sujeito: nominativo plural;
b) senhoras-objeto direto: acusativo plural.

Serva no nominativo singular é SERVA e no nominativo plural, SERVAE.
Senhora no acusativo singular é DOMINAM, no acusativo plural DOMINAS.

Nosso exemplo ficará: SERVAE DOMINAS AMANT.

E se quiséssemos essa frase toda no singular? O nominativo singular de serva você já sabe: é SERVA. O acusativo singular de domina é DOMINAM. O verbo na terceira pessoa do singular é AMAT. Teremos então:
SERVA DOMINAM AMAT.


2.)
A mãe prepara a ceia.

A análise nos mostra que o sujeito é a mãe, núcleo do predicado o verbo preparar que, por ser de predicação incompleta exige o complemento (o que a mãe prepara?) “a ceia”, o objeto direto. Então, mãe deve ficar no nominativo singular, ceia no acusativo singular,e o verbo na terceira pessoa do singular – parat..

a) A palavra mãe, no nominativo singular é MATER.
b) A palavra ceia no nominativo singular é CENA, e no acusativo singular é CENAM.
c) O verbo preparar, na terceira pessoa do singular é PARAT.
Nosso exemplo ficará, então, em latim: MATER CENAM PARAT.

3.)
O filho ama a mãe.

Análise: o filho: sujeito, nominativo singular; a mãe: objeto direto, acusativo singular.
a) Filho, no nominativo singular é FILIUS.
b) Mãe, mater, no acusativo singular é MATREM
c) O verbo na terceira pessoa do singular, presente do indicativo: AMAT

O exemplo ficará: FILIUS MATREM AMAT.

NB. No exemplo anterior a palavra mãe apareceu sob a forma MATER, pois era o sujeito da oração - nominativo; neste, aparece como MATREM, pois é o objeto direto – acusativo.

E se quiséssemos passar esse exemplo para o plural?
a) O nominativo plural de FILIUS é FILII;
b) o acusativo plural de MATER é MATRES;
c) o verbo na terceira pessoa do plural, presente do indicativo, é AMANT.
O exemplo fica: FILII MATRES AMANT.

2. A ORAÇÃO: SUJEITO E PREDICADO

Como vimos na postagem anterior, A FLEXÃO DE CASO, o latim exprime a função sintática por meio da flexão de caso. Cada caso representa um conjunto de noções ou de relações semânticas associadas a características morfológicas; tais características encontram-se no fim da palavra e recebem o nome de desinências. As mudanças de forma que a palavra sofre são exatamente o que denominamos “flexão”.

Em latim há seis casos: Nominativo, Genitivo, Acusativo, Dativo, Ablativo e Vocativo. Mas, antes de abordar cada caso, vamos recordar o conceito de oração.

ORAÇÃO

Palavra: vocábulo e termo
Na linguagem verbal as idéias são expressas através de palavras. Podemos distinguir duas realidades na palavra: 1. a palavra enquanto representação material, ou seja o som ou sua aparência gráfica, e a isso chamaremos de vocábulo; 2. a palavra enquanto índice da idéia que encerra, ao que chamaremos termo. Dito de outra forma, a palavra apresenta dois aspectos: um externo, onde podemos observar, por exemplo, o número de sílabas, a acentuação tônica, a ortografia etc. e outro interno, a saber, o conteúdo, a idéia, o sentido que exprime.

Um pensamento ou uma idéia completa pode ser expresso em sua forma mais simples por uma única palavra. O pensamento se formula em bloco, por assim dizer, como no caso das interjeições e exclamações: Ai!, Orra, meu!, Pô, cara!!!... Mais para frente voltaremos a esse assunto.



A frase ou locução
Mas é comum que usemos reuniões de palavras (termos) para expressar pensamentos ou idéias mais complexas. Assim, se digo “o livro de Pedro”, “os olhos de cigana de Capitu” ou “as margens plácidas do Ipiranga”, estou reunindo palavras para expressar idéias; a essa reunião ou agrupamento de termos denominamos locução ou frase. Mas, perceba que ao dizer “o livro de Pedro” ou “as margens plácidas do Ipiranga” estou exprimindo idéias sem, contudo, afirmar ou negar alguma coisa a respeito delas.

A oração
Quando uma frase encerra uma declaração, ou seja, afirma ou nega algo de alguém ou alguma coisa, temos então uma oração. Por ex.: “O livro de Pedro é grande”; a respeito do “livro de Pedro” declaro ser grande; há algo a respeito de que eu faço uma declaração, o livro de Pedro e há algo que eu declaro, que é grande. Outro exemplo: “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas, de um povo heróico o brado retumbante”. Afirmo, a respeito das “margens plácidas do Ipiranga” que elas “ouviram o brado retumbante de um povo heróico”; tenho novamente os dois elementos: algo a respeito do qual faço uma declaração, As margens plácidas do Ipiranga, e aquilo que eu declaro a respeito, ou seja, que ouviram de um povo heróico o brado retumbante.



Os dois principais elementos da oração: O sujeito e o predicado
Embora um pensamento possa ser expresso por uma única palavra, ou por uma locução, o mais comum é que se expresse por meio de uma oração, a saber, uma frase que encerra uma declaração a respeito de alguém ou de algo, e que apresenta, na maior parte dos casos, dois elementos: 1. o ser de que se declara algo, o SUJEITO, e aquilo que se declara a sobre o sujeito, o PREDICADO.

Como você pode ver pelos exemplos dados, tanto o sujeito como o predicado podem ser constituídos de uma só palavra, ou de muitas, ou até mesmo por uma ou várias orações. Isso será objeto de importante aprofundamento do nosso estudo quando estudarmos os processos sintáticos denominados expansão, determinação e aposição.

Mas, mesmo que o sujeito seja formado por mais de uma palavra, existe sempre uma única palavra que é como que o seu núcleo. Por exemplo, se digo “A galinha do vizinho bota ovo amarelinho”, o sujeito é “a galinha do vizinho”; mas o núcleo desse sujeito é “galinha”, a palavra essencial. Uma certa nomenclatura gramatical dirá que “a galinha do vizinho” é o sujeito lógico da oração, enquanto “galinha” constitui o sujeito gramatical. Outra forma de abordar esse assunto é chamar “a galinha do vizinho” de sintagma do sujeito, e “galinha” de núcleo do sujeito. Mas são apenas duas maneiras de dizer a mesma coisa.

Como o sujeito é a pessoa ou coisa sobre a qual se faz uma declaração fica claro que deve ser constituído por um substantivo, ou por qualquer palavra, frase ou oração que tenha força de substantivo.

Da mesma forma, o predicado, mesmo que possa ser representado por mais de uma palavra, apresenta sempre uma que é seu núcleo. E o núcleo do predicado é sempre um verbo, palavra que serve para exprimir uma ação, um processo ou atribuir um estado. Dessa maneira, no nosso exemplo anterior, “a galinha do vizinho bota ovo amarelinho”, temos o predicado “bota ovo amarelinho”, centrado sobre o núcleo “bota”; claro que caberia a pergunta “bota o quê”, mas isso nos conduz a um tema que será abordado mas para frente.

Assim, o núcleo central dessa oração se concentra sobre os dois termos “galinha – bota”: afirmamos a respeito da “galinha” (sujeito) que ela “bota”.








terça-feira, 26 de janeiro de 2010

1. A FLEXÃO DE CASO

VAMOS INICIAR NOSSO ESTUDO RECORDANDO UM CONCEITO FUNDAMENTAL: A FLEXÃO

Flexão nada mais é que a propriedade que certas palavras possuem de sofrer alterações na sua parte final. Existem palavras que possuem essa propriedade e são chamadas de palavras variáveis, enquanto outras não a possuem, e por isso são chamadas de palavras invariáveis.

Nas palavras variáveis distinguimos dois elementos. À parte final, flexível, da palavra, denominamos desinência; à parte que sobra, tirada a desinência, e que é fixa, denominamos tema ou radical. Assim, por exemplo, na palavra menino podemos distinguir o radical menin e a desinência o:

menin – o

Mudando-lhe a desinência podemos obter, por exemplo, as seguintes flexões:

menina
meninos
meninas
menininho
meninão

A flexão de uma palavra implica sempre alteração na idéia que ela exprime; tal alteração dá-se, em português, quanto ao gênero, número ou grau nos substantivos, adjetivos e pronomes, ou quanto ao tempo e pessoa nos verbos.


As flexões existentes na língua portuguesa

Como acabamos de ver, substantivos, adjetivos e pronomes são palavras flexíveis e podem flexionar-se de três maneiras:

a) quanto ao gênero;
b) quanto ao número;
c) quanto ao grau.

Na língua latina encontramos um gênero a mais, que não existe em português: o gênero neutro. Para o início do nosso estudo tenhamos em mente os seguintes três gêneros em latim: masculino, feminino e neutro.

A flexão de número em latim funciona como em português: singular e plural. Ao longo do nosso estudo, porém, veremos que o latim conserva alguns resquícios de um antigo número dual.

Quanto ao grau também tudo se dá em latim como em português: para os substantivos temos os graus normal, aumentativo e diminutivo, e para os adjetivos, além desses três, temos o comparativo e o superlativo.

Até agora a única novidade em relação à nossa língua é que em latim existe o gênero neutro. A próxima novidade, importantíssima, e que nos ocupará bastante tempo de estudo, é que em latim temos mais um tipo de flexão: a flexão de caso.


Uma flexão a mais em latim: a flexão de CASO

A flexão de caso consiste na alteração da desinência da palavra de acordo com a função sintática, ou seja, de acordo com a função que ela exerce na oração. Quer dizer que um substantivo, adjetivo ou pronome apresenta desinências diferentes de acordo com o papel que estiver desempenhando na oração, a saber, sujeito, predicativo, objeto direto, objeto indireto, adjunto adverbial, etc.

Tomemos, por exemplo, uma frase bem simples:

Pedro ama Maria.

A análise sintática nos dirá que Pedro é o sujeito da oração, e ama Maria, o predicado. Nesse predicado identificamos o verbo ama (amar) como um verbo que pede obrigatoriamente um complemento, pois quem ama, ama alguém ou alguma coisa; temos então em Maria o complemento do verbo, que nesse caso chama-se objeto direto. O nome Pedro - PETRUS receberá a desinência própria do sujeito ao passo que Maria - MARIA receberá a desinência do objeto direto - MARIAM:

Petrus amat Mariam

Note que, uma vez que a função sintática é identificada pela desinência, há uma flexibilidade maior na ordem das palavras; isso quer dizer que nossa frase poderia ser dita da seguinte forma sem alteração do sentido:

Petrus Mariam amat.

Imagine a situação contrária: Maria ama Pedro. A análise sintática nos mostrará que Maria é o sujeito agora, e Pedro, o objeto direto. Pois bem, Maria receberá a desinência do sujeito - MARIA, e PETRUS, a do objeto direto - PETRUM; teremos então:

Maria amat Petrum

ou

Maria Petrum amat.

O caso do sujeito chama-se em latim o caso Nominativo, e o do objeto direto, acusativo. Há em latim seis casos, e o início de nosso estudo será exatamente o estudo dos diversos casos e suas desinências.

Vamos imaginar agora outra frase:

Maria deu o livro a Pedro.

Feita a análise sintática saberemos que Maria é o sujeito e livro é o objeto direto. Mas essa oração apresenta um outro complemento do verbo; como quem dá, dá alguma coisa (objeto direto) a alguém, temos aqui um outro tipo de objeto o objeto indireto; o objeto indireto em latim é chamado de caso dativo. Vamos agora montar a frase. A palavra livro em latim é líber, mas na forma do objeto direto, ou seja, no acusativo, fica librum. O nome Pedro, você já sabe, é Petrus; você já sabe também que, se Petrus for objeto direto, ou seja, acusativo, aparecerá como Petrum; na nossa oração, entretanto, Petrus é objeto indireto, dativo: aparecerá sob a forma Petro. Assim, finalmente nossa frase aparecerá como


Maria Petro librum dedit.


Note também que a oração parece ter ficado com uma forma invertida em relação à forma que apresenta em português, o que não altera em nada o sentido, já que cada palavra aparece flexionada segundo a função sintática que exerce. Por outro lado essa ordem é preferida em latim: verbo no final da frase, objeto direto antes do verbo, objeto indireto antes do direto.

Resumindo: se em português as palavras variáveis são flexionadas em gênero, número e grau, em latim flexionam-se em gênero, número, grau e caso, ou seja, de acordo com a FUNÇÃO SINTÁTICA.

Penso que você já entendeu que precisa ter a análise sintática na ponta da língua. Com efeito, tanto para traduzir do latim para o português, quanto para traduzir de português para o latim é necessário proceder à análise sintática de cada oração.